segunda-feira, 23 de julho de 2012

Racismo na obra de Lobato?


Preconceito Racial em Histórias de Tia Nastácia


             A representação do negro na obra de Monteiro Lobato corresponde com a época em que  vivia.  Durante  a  infância  Lobato  presenciou  o  fim  da  escravatura  no  Brasil,  a  Princesa Isabel sancionou a  Lei  Áurea em 13 de maio de 1888, garantindo a liberdade a mais de 700 42 mil escravos no país. Apesar deste feito que traria o progresso a todos os cidadãos brasileiros, alguns  negros  mesmo  com  a  lei  que  os  defendiam,  ainda  trabalhavam  para  seus  antigos patrões, este foi o ponto abordado por Lobato em sua narrativa. 
             De  acordo  com  Penteado  (2011,  p.  191),  realizador  de  estudos  e  pesquisas  sobre  a obra  infantil  de  Monteiro,  na  saga  Sítio  do  Picapau  Amarelo  Lobato  mantém  a  personagem negra  Tia  Nastácia  na  cozinha  do  Sítio  de  Dona Benta,  que  foi  sua  proprietária  na  época  da escravidão, mesmo com a liberdade continuou a trabalhar para Dona Benta. Em Reinações de Narizinho (1920) destaca-se o trecho que fale um pouco sobre a negra: — tia Nastácia, negra de estimação que carregou Lúcia em pequena [...] (p. 02)


               As características físicas de Tia Nastácia são comentadas por Penteado, pois tiveram importância  na  representação  do  negro  na  obra  infantil.  Tia  Nastácia  é  ex-escrava  de  Dona Benta e levou uma vida sofrida por ser analfabeta, sempre estava com um lenço na cabeça e um  avental,  o  que  fazia  de  melhor  era  cozinhar.  Lobato  buscou  representar  sua  personagem negra com verossimilhança ao negro dos anos de pós-abolição. Os pintores que colaboravam para  a  representação  dos  personagens  de  Lobato  caricaturavam  a  negra  com  uma  tintura  de forma grotesca em relação à cor da pele da negra e os lábios grandes. (Cf. PENTEADO, 2011, p. 89)

            Marisa Lajolo, leitora desde criança das obras de Lobato, se torna pesquisadora sobre essas obras. Argumenta sobre a participação da personagem Tia Nastácia na narrativa, a qual está sempre vinculada à cozinha, na obra O Minotauro, ela é sequestrada e levada pela criatura mitológica para que demonstre seus dotes culinários, no desenlace da história Tia Nastácia doma o minotauro com seus bolinhos. Lobato busca relacionar sua personagem com o saber de negra cozinheira, este espaço restrito apenas a cozinha se torna um emblema de seu confinamento e de sua desqualificação social. (LAJOLO, 1998)

            Lajolo (1998) publicou um artigo que discute sobre A figura do negro em Monteiro Lobato em suas obras, na obra Histórias de Tia Nastácia a cozinheira ganha o papel de contadora de histórias, papel até então exercido por Dona Benta, e leva para as crianças o conhecimento que possui sobre o folclore brasileiro. Pedrinho logo se empolga com o significado de folclore e diz: 


Uma ideia que eu tive. Tia Nastácia é o povo. Tudo que o povo sabe e vai contando, de um para outro, ela deve saber. Estou com o plano de espremer tia Nastácia para tirar o leite do folclore que há nela. [...]
 — As negras velhas — disse Pedrinho — são sempre muito sabidas. Mamãe conta de uma que era um verdadeiro dicionário de histórias folclóricas, uma de nome Esméria, que foi escrava de meu avô. Todas as noites ela sentava-se na varanda e desfiava histórias e mais histórias. Quem sabe se tia Nastácia não é uma segunda tia Esméria? (p. 05-06).

Fonte: Lobato, Monteiro. Histórias de Tia Nastácia. Versão Digital


              De acordo com Penteado (2011) as características de Tia Nastácia tiveram uma pretensão por parte de Lobato, no trecho descrito acima a posição que ele insere sua personagem negra é de contadora de histórias, papel desempenhado nas obras anteriores e posteriores a Dona Benta. Tia Nastácia é conhecedora do folclore brasileiro, então a informação sobre as histórias brasileiras deveria ser repassada pela personagem que é a voz do povo. Seus ouvintes serão os mesmo de Dona Benta, as crianças aprendizes de histórias por meio de uma mentora, Pedrinho, Emília e Narizinho.
              Lajolo (1998) argumenta e destaca outros trechos de Histórias de Tia Nastácia em seu artigo relacionado à figura do negro nas obras de Monteiro, discute sobre os comentários da boneca Emília que formam estereótipos, que segundo Bernd (1988) é uma generalização estabelecida que se mantenha vinculada a respeito de um indivíduo. A linguagem da boneca também é racista, pois ela sente-se superior a Tia Nastácia e a ofende proferindo palavras ofensivas e preconceituosas, pois ela nega as histórias contadas pela negra cozinheira. De acordo com Chochík (2008) o preconceito também está relacionado ao comportamento agressivo com outro que seja sensível, conduta presente nas falas de Emília:

— Pois cá comigo — disse Emília — só aturo essas histórias como estudos da ignorância e burrice do povo. Prazer não sinto nenhum. […] — coisa mesmo de negra beiçuda, como tia Nastácia. Não gosto, não gosto e não gosto... [...] (p. 24).
— Bem se vê que é preta e beiçuda! Não tem a menor filosofia, esta diaba. [...] (p. 88)


Fonte: Monteiro Lobato, Edição Centenário

             O termo ao qual Emília se refere à Tia Nastácia cria um estereótipo na personagem, sendo este racista, pois a discriminação está relacionada à aparência física da negra, vinculando também ao preconceito racial, fato social do Brasil por volta dos anos de 1930, e se desenvolve com as ideias a respeito da superioridade de um indivíduo em relação ao outro. As características físicas da negra são estereotipadas pela boneca, ao qual se refere a cozinheira como preta e beiçuda.
              A linguagem com palavras ofensivas de Emília as histórias contadas por Tia Nastácia segundo Lajolo (1998) consiste no fato de que a narradora é negra e analfabeta, repassa somente aquilo que sabe por ouvir seus antepassados contarem, não tendo valor no conhecimento cultural dos ouvintes, os quais acham bobagens de negra velha.
              De acordo com Lajolo (1998, p. 04) os xingamentos, através da boneca Emília, demonstram que a negra cozinheira, por mais que mude sua posição na história e passe a ser narradora, não receberá a mesma consideração social e valorativa de sua narrativa, pois seu conhecimento vem do povo e não da cultura escrita, como é munida Dona Benta. Desta forma Tia Nastácia permanece como inferior em relação aos seus ouvintes, discriminada devido sua condição social. Outro ponto analisado por Lajolo (1998, p. 03) na questão dos xingamentos discriminatórios de Emília é de que Lobato escreveu sua narrativa com traços de linguagem verossímeis ao uso coloquial da sociedade brasileira de 1930, com isso surgem ambiguidades em relação ao racismo ou não de Lobato, pois na linguagem de alguns personagens o escritor valoriza o conhecimento da negra: — As negras velhas — disse Pedrinho — são sempre muito sabidas. (p. 05-06)

              A inferioridade social, segundo Lajolo (1998, p. 06) se destaca também através de Dona Benta, ela de certo modo desvaloriza a narrativa de sua doméstica, afirma que a história de Tia Nastácia, a que o povo passa de geração para geração, sofre alterações conforme cada um vai contando, sempre há mudança na oratória. A posição da negra como a oradora de histórias não contribui a nenhuma elevação cultural de seus ouvintes, pois não relata fatos da literatura moderna infantil como Peter Pan e D. Quixote contados por Dona Benta. O seguinte trecho relata a opinião de Dona Benta:

— Você tem razão, Emília — disse dona Benta. — As histórias que andam na boca do povo não são como as escritas. As histórias escritas conservam-se sempre as mesmas, porque a escrita fixa a maneira pela qual o autor a compôs. Mas as histórias que correm na boca do povo vão se adulterando com o tempo. Cada pessoa que conta muda uma coisa ou outra, e por fim elas ficam muito diferentes do que eram no começo. [...]
— Sim, aumenta um ponto e introduz qualquer modificação. Ninguém que ouça uma história é capaz de contá-la para diante sem alteração de alguma coisa, de modo que no fim a história aparece horrivelmente modificada. [...] (p. 18).

              Emília representa no contexto da narrativa o sistema totalitário, pois ela nega a liberdade de ação das histórias contada pela negra, à ideologia da boneca representada por sua linguagem rejeita e não aceita a cultura da cozinheira, ela diz “[...] só aturo essas histórias como estudo de ignorância do povo. Prazer não sinto nenhum [...], desta forma a boneca isola a personagem Tia Nastácia devido o conhecimento que possui, e ainda discrimina com a fala [...] coisa mesmo de negra beiçuda [...] direcionando essa característica para o estereótipo, que generaliza o conhecimento a negra beiçuda
              Logo Dona Benta também assume o papel de mentora dominante justificando a origem dos contos da negra, pois seu conhecimento provém de livros, o que é provado em escrita tudo o que diz, dando veracidade nos fatos de sua história, dando total liberdade de desvalorizar a função atual da negra, “o totalitarismo silencia a voz da experiência, substituindo-a pelo discurso único e absoluto do poder” (CROCHÍK, 2008, p. 38), fazendo com que ela seja inferior a sua patroa Dona Benta. Sendo assim a negra cozinheira e a avó sábia não se igualam em relação ao conhecimento e atribuições. (LAJOLO, 1998, p. 06)
              No trecho a seguir, Dona Benta justifica o motivo pelo qual as histórias de Tia Nastácia são tão distorcidas e tão diferentes das que ela conta:

— Sim — disse Dona Benta. — Nós não podemos exigir do povo o apuro artístico dos grandes escritores. O povo... Que é o povo? São essas pobres tias velhas, como Nastácia, sem cultura nenhuma, que nem ler sabem e que outra coisa não fazem senão ouvir as histórias de outras criaturas igualmente ignorantes, e passá-las para outros ouvidos, mais adulteradas ainda.[...] (p. 23)

              O papel de mentora atribuído a Tia Nastácia é de relatar os seus conhecimentos em relação a histórias que o povo conta, traz para as crianças do sítio sua herança africana, sua cultura. As desvalorizações de seus conhecimentos estão relacionadas ao fato dos contos não terem origem Europeia, assim como as de Dona Benta descendente de europeus e de raça branca que são originadas de livros, seus serões são de conhecimentos do povo, repassados de geração para geração.
              Seguindo as explicações abordadas por Crochík (org. 2008) os ouvintes de Tia Nastácia são como totalitaristas, pois corrompe a liberdade da fantasia das histórias contadas pela negra, fazendo críticas sobre a origem da narrativa, nega a manifestação da cultura do povo. Surge a partir dos julgamentos destes ouvintes o racismo, pois Tia Nastácia é atingida pela violência totalitária, menospreza o conteúdo de seus serões por ter origem apenas da oralidade, e eleva o valor das histórias contadas por Dona Benta que provem de livros.
              Lobato abordou em sua obra infantil uma realidade aproximada, a verossimilhança da realidade que o negro passava na época do Brasil pós-escravidão, fato que decorreu durante os anos 30. De acordo com os textos de Lajolo, que argumenta sobre a questão de racismo do autor do Sítio do Picapau Amarelo, explicita os pontos destacados como preconceituoso, ele demonstra que o branco sempre teve razão e é superior ao negro, mesmo que esse negro assuma o lugar de informante de conhecimento que irá aumentar a cultura dos ouvintes, sendo evidente que havia superioridade mesmo após o fim da escravidão e libertação de todos os negros, ele assim mesmo seria inferior ao branco. Em alguns momentos pode-se encontrar ambiguidade se há preconceito ou não, mas a realidade de sua obra ficcional é latente que a escravidão deixou resquícios entre raças.

            Essas diferenças são representadas na plateia de Tia Nastácia, ao narrar suas histórias os ouvintes se recusam a acreditarem nelas, e a justificativa é de que as histórias de Dona Benta são mais intrigantes e possuem aventuras, características que prende a atenção das crianças. Constatando que os dotes de Tia Nastácia não estão direcionados a narrar histórias de aculturamento para seu público e sim na cozinha como afirma Lajolo (1998, p. 5):


Mas como Tia Nastácia não é dona Benta, a situação de oralidade que ela protagoniza não aponta para além de si mesma e, sobretudo, não contribui para elevação cultura de seus ouvintes, já que nem os familiarizam com a moderna literatura infantil como Peter Pan e tampouco os aproxima de clássicos como D. Quixote; muito pelo contrário, constitui um rebaixamento cultural, já que é arcaico o mundo que se faz presente em suas histórias.

                   Mesmo que Tia Nastácia exerça a função de Dona Benta, sua narrativa não terá tanta ênfase na ampliação do conhecimento de seus ouvintes, os quais estão acostumados com as histórias infantis lidos e narrados pela avó, demonstra o valor entre uma cultura que repassa o conhecimento através da oralidade e outra que tem por embasamentos escritos aprimorados da história do povo.

                  Da forma que o personagem negro foi abordado nesta narrativa de Lobato a pretensão é intencional, pois ele demonstra o valor que é cedido aos negros brasileiros da época em que vivia e o lugar estereotipado a eles, a negação do totalitarismo que menospreza a mudança de posição desta personagem negra ao desenvolver o ato de contar histórias adquiridas pela oralidade, à discriminação ao trabalho doméstico relacionado ao prestador de serviços aos brancos, e a inferioridade da negra em relação aos demais habitantes do Sítio.


Fonte: 

SANTOS, Yndianara da Silva. Estereótipo racista na obra de Monteiro Lobato? Histórias de Tia Nastácia. Brasília, 2012.








A vida de Lobato


Aos 18 de abril de 1882 nasce o primogênito de José Bento Marcondes Lobato e Olímpia Augusta Monteiro Lobato, batizado com o nome de José Renato. Foi o único filho homem da família, todos o chamavam de Juca. Uma atitude do jovem é intrigante, aos 11 anos decide mudar o nome para José Bento, na época seu pai tinha uma bengala, marca que representava à elegância do homem, e mudando o nome poderia utilizá-la futuramente. Eles viviam em uma fazenda Santa Maria em Ribeirão das Almas, próximo a Taubaté. Como qualquer menino da época gostava de pescarias, banhos de cachoeiras, tiros de espingarda e passeio a cavalo. Visitava constantemente a casa do avô José Francisco Monteiro, o Visconde de Tremembé, encantava-se com a biblioteca que mantinha, estes chamavam mais a atenção de Lobato do que a presença do Imperador Pedro II, hóspede de seu avô.

Seu letramento inicia com a mãe Olímpia, filha do Visconde Anacleta Augusta do Amor Divino, sua avó era professora do primário conhecida como “vó Anacleta”. Como fazia parte da época e da classe, Lobato estuda com professor particular após os primeiros passos ensinados pela mãe, e aos sete anos de ingressa no Colégio Kennedy, e logo após em outras diversas escolas de Taubaté, entre elas o Colégio Americano, o Colégio Paulista e o São João Evangelista de Antônio Quirino de Sousa e Castro, escola onde conhece sua futura esposa, a neta do Quirino.


No final do século XIX, com 13 anos Lobato vai para São Paulo com destino ao Instituto de Ciências e Letras da capital, lá aprofunda seus estudos em matérias especificas para o curso de Direito, mas acaba reprovando em Português e retorna para sua cidade Taubaté e para o Colégio Paulista. Nesta época colabora com a publicação de um jornalzinho estudantil O Guarany. Resolve usar pseudônimos para a assinatura de seus textos, Lobato é agora para os leitores Josbem e Nhô Dito. 

Monteiro retorna a São Paulo em 1896 para fazer novos testes, desta vez consegue a aprovação. Entra para o Instituto Ciências e Letras se mantêm durante três anos, após isto reprova em latim. Novamente utilizando pseudônimos, Gustavo Lannes colabora com outros jornais estudantis O Patriota e A Pátria, futuramente cria seu próprio jornal, rotulado como H2O. Tem participação no Grêmio Literário Álvares de Azevedo em que declama poesias, faz discursos e compete com outros alunos torneios oratórios.

Em Junho de 1898 seu pai vem a falecer, a mãe um ano seguinte, em junho de 1899. Embora tenha o desejo de ser pintor ou engenheiro segue o sonho do avô e entra no curso de Direito em 1900 na faculdade do largo de São Francisco. Foi eleito em 1902 presidente do Centro Acadêmico Arcádia, tendo colaboração no jornal Onze de Agosto. Durante este período escreve para vários jornais estudantis, com assuntos relacionados a teatro, arte e música. Na faculdade não simpatiza com os professores e passa a debater ideias sobre anarquismo, faz caricatura dos mestres, se envolve com a filosofia dos revolucionários e participa da política estudantil.

Em 1903 faz constantes críticas teatrais e participa de um concurso literário com o conto Gens ennuyeux, vence o concurso e o jornal publica em 1904. Em conjunto, suas amizades influentes do grupo O Cenáculo é repleto de literatura e boemia, reuniam-se no Café Guarany e lá trocavam ideias literárias. Na companhia de Godofredo Rangel e Ricardo Gonçalves reúnem-se em um chalé amarelo, em que batizam de O Minarete. Este nome também foi utilizado para nomear um jornal da cidade de Pindamonhangaba, interior de São Paulo, o autor é Benjamim Pinheiro, amigo do grupo O Cenáculo. O conteúdo do jornal é contribuído pelos integrantes do chalé, Lobato agora escreve com o pseudônimo Yewski, devido suas publicações polêmicas, criticado pela população, a direção do jornal logo cancelou seus textos. Neste período o adolescente de Taubaté assina com vários pseudônimos: Rodanto Cor de Rosa, Lobatoyewski, Guy d’Hã, Marinho Dias, Hélio Bruma, HB e ML.


Conclui o curso de Direito em 1904, retornando para sua cidade é recebido com discursos e banda musical, o elogiando pelo bacharelado em Direito. No ano de 1905 planeja montar seu próprio negócio, pretendia investir em uma indústria de doces e geleias, com o intuito de reduzir a mesmice presente na cidade. Lobato já namora a neta do doutor Quirino, seu velho professor e rival no xadrez, Maria Pureza da Natividade. Em 1907 eles ficam noivos, o jovem pensando em casar precisa de um emprego para manter sua família, tem em mente um cargo público, pois condiz com sua formação. Decorrente das influências de seu avô consegue um cargo de promotor na cidade de Areias, município próximo ao Vale do Paraíba.

Juca e Purezinha se comunicam por cartas, a mudança para Areias distancia os noivos, o tédio toma conta de juquinha e deixa de fazer seus hobbies, busca outra forma de preencher as horas vagas em que está só em Areias, escreve diversos contos que são publicados em revistas, e tempos depois forma um livro só de contos em 1918. Traduz para o Estado de São Paulo artigos de Weekly Times.

Como advogado, executa sua primeira causa e única, entre João Costa e Sá e a firma Gonçalves & Ferreira e ganha. Casa-se com Maria Purezinha um ano após o noivado, em 1908, realizado em São Paulo. A lua de mel é nas praias da cidade de Santos, mas um acidente envolvendo os recém-casados antecipa a volta deles, acabam pisando em um molusco venenoso e queimam os pés, o tratamento é feito em Areias, local onde passam a morar. Lobato e sua esposa se mudam para um casarão, frequentemente ganha folgas da promotoria, sobrando tempo o suficiente para enviar suas produções para diversos jornais e revistas de outras cidades próximas de Areias. Uma carta enviada a seu cunhado em 1909, demonstra a vontade que tem de mudar de vida e da cidade tão pacata.

Em 1911 morre seu avô, o Visconde de Tremembé, Lobato então se torna o único herdeiro do patrimônio da família, a fazenda Buquira localizada em Mantiqueira, torna-se fazendeiro empresário, apesar da imensidão das terras, a fazenda é decadente, mas muda-se com sua família assim mesmo, e já tem sua primogênita Marta, que nasceu em 1909 e Edgar em 1910. O recém-fazendeiro tenta aumentar o lucro da lavoura e agricultura, importa cabras, galinhas, porcos, possui plantação de café, milho e feijão que também são importados, mas devido os tempos difíceis para política o cultivo em fazendas. Esta crise inspira o escritor a enviar uma carta à seção Queixas e reclamações do jornal o Estado de S. Paulo, a fazenda é administrada por ele de 1911 a 1917, período em que escreve o texto Velha praga em que desabafa sobre a vida caipira, este texto originou os personagens Jeca Tatu, Chico Marimbondo e Manuel Peroba, feito que trás sucesso a Lobato.


Estes indícios colaboram para que Lobato pense logo em vender a fazenda, pois só há gastos e nada de lucro. Anuncia, mas demora anos até que aparece um interessado em comprá-la, se chama Antônio Leite, fecham negócio em 1917, possibilitando a mudança da família Monteiro Lobato para Paulicélia, cidade no interior de São Paulo, agora com mais dois filhos Guilherme que nascera em 1912 e Ruth em 1916. Ainda como colaborador de manchetes para o Estado de S. Paulo, o jornal publica outro texto de Monteiro, nivelado como do mesmo porte de Velha praga, o texto é destinado à exposição da pintora Anita Malfati, seguidora do Modernismo Europeu. A forma com que faz sua arte, com que trabalha as cores em seus quadros não agrada Lobato, porém reconhece o talento da artista. Logo surge Oswald de Andrade, jovem também, tem ideais opostos aos de Monteiro, em colaboração com outro jornal Oswald é a favor do modernismo e elogiam os dotes de Anita, essas atitudes foram o bastante para declarar a oposição de ideias, em um lado os modernistas e de outro o Lobato solitário.


Em um discurso político que aconteceu no Teatro Lírico no Rio de Janeiro em 1919, Rui Barbosa cita Lobato, tornando-o ainda mais popular. Sua primeira história infantil é publicada em 1920, com o nome de A menina do Nariz Arrebitado, o texto é uma edição da Revista Brasil. Alguns problemas financeiros se alastraram em São Paulo nos anos 20, a editora Revista do Brasil, conhecida como sua empresa Monteiro Lobato & Cia e depois como Companhia Gráfico-Editora Monteiro Lobato abre falência, o principal fator da quebra de sua empresa é a Revolução de 1924 que mobilizou a cidade e afetou os leitores, que tiveram de reduzir os gastos devido à crise no estado. 

Em 1925 abre a Companhia Editora Nacional junto a Octales Marcondes, com resquícios da Gráfica Editora Monteiro Lobato, ano que se transfere para a República do Rio de Janeiro. Octales cuida da parte administrativa da empresa, enquanto Monteiro para a editorial. Octales logo imprime a primeira obra da nova editora Hans Staden: meu cativeiro entre os selvagens do Brasil, o texto foi organizado por Monteiro. Mesmo com essa torrente que levou a falência suas primeiras editoras Lobato cria o Sítio do Picapau Amarelo, entra em circulação em 1921 e também A menina do nariz arrebitado, obra integral continuação da tiragem da Revista do Brasil.

Lobato está voltado para o gênero infantil, apesar do sucesso que teve com os livros não infantis, foca em seus personagens do sítio e nas crianças leitoras. Do Brasil à Argentina suas obras fazem sucesso, é assim por toda a sua vida, dando inicio a literatura infantil brasileira. Repletos de aventuras e ensinamentos o sítio do picapau amarelo é educativo para os brasileirinhos. Distribui para as escolas públicas quinhentos de seus exemplares, assim Lobato consegue vender trinta mil ao governo estadual. Washigton Luís, governador de São Paulo, visita a escola Alarico Silveira, e lamentando a situação dos livros utilizados pelos alunos, faz está compra grande das obras de seu amigo Lobato. 

Devido influências de Washigton Luís no governo seu amigo Alarico Silveira é nomeado chefe da Casa Civil, sendo indicado por ele. As publicações por período nos jornais com assuntos críticos não agradam os militares, logo Lobato sai do Brasil e assume o cargo comerciário brasileiro em Nova York.

Antes de embarcar para Nova York, Lobato publica em folhetins O presidente negro ou O choque das raças, subtitulado de Romance americano que se passa no ano de 2228, uma época futurística, o jornal A manhã o divulga. O interesse de Monteiro a esta publicação em cima da hora de sua partida era de que conseguisse ingressar na literatura norte-americana, sua intenção era de fundar a editora Tupy Publishing Company. 

Embarca com sua família para os Estados Unidos em 1927, lá presencia o desenvolvimento do país americano, conclui que o progresso advém do investimento no petróleo e ferro, o crescimento é por meio das máquinas e tecnologias. Defende os ideais de Smith que não utilizava o carvão para a exploração de ferro no Brasil. Faz investimentos na Bolsa de Nova York em 1929, no ano seguinte perde todo o seu capital inserido no mercado estrangeiro e retorna ao Brasil em 1931 e decide montar seu próprio negócio para desenvolver ferro, chamado de Sindicato Nacional de Indústria e Comércio, porém, perde o ânimo com o ferro e começa a investir no petróleo. 

Demonstra sua admiração e êxtase em meio a tanta produção e desenvolvimento por cartas enviadas a seus amigos. E nos Estados Unidos vivem por um bom tempo, lá sua filha Marta casa-se, infelizmente um de seus filhos tem uma doença grave, cuidados que fez Lobato recorresse à ajuda financeira. Planeja o desenvolvimento do ferro e aço no Brasil assim que retornar, envia diversas cartas em que relata suas ideias aos amigos. Investimento que iria render em milhões de dólares, pretensão de Monteiro. Seu encanto com o mercado americano o influência a aplicar dinheiro na Bolsa de Valores de Nova York, mas quebra em 1929 e seus investimentos escorrem junto ao fracasso da bolsa. A crise mundial abala o cargo que possui e o governo do amigo Washington, a pobreza de Lobato e ausência de conhecidos no poder faz com que ele retorne ao Brasil.

Retornando ao Brasil volta à ativa como escritor, pois este seria a única forma de manter sua família, vende suas ações aplicadas na Companhia Editora Nacional. Sua renda agora advém dos escritos infantis e traduções. E apesar da crise em que está passando não deixa de acreditar no desenvolvimento petrolífero do Brasil, com isso incentiva o investimento criando companhias para a extração do petróleo. Apesar de abrir a Companhia de Petróleo do Brasil, Companhia de Petróleo Nacional, Companhia petrolífera Brasileira e a Companhia de Petróleo Cruzeiro do Sul, todas abrem falência tempos depois, decorrente de boicotes e sabotagem elétrica.


Em 1936 publica O escândalo do petróleo, narrativa de Lobato que relata o projeto e motivo do fracasso com o investimento que a princípio seria milionário, mas o governo da época não colabora muito com este progresso. Já no governo de Vargas a ditadura militar inicia as censuras a tudo que desrespeite ou ameace o atual governo, logo a obra de Lobato é proibida de circular, da mesma forma a proibição da exploração e extração de petróleo.
            
Em 1940 o presidente Vargas oferece a Lobato um cargo no Ministério de Propagandas, mas o escritor recusa, no ano seguinte é preso por enviar cartas a Getúlio o culpando pela má gestão política e fracasso no minério. Na penitenciária aproveita a situação para analisar os problemas que os presos passam, ensina-os a ler, se torna companheiro de alguns dividindo o alimento que recebe da esposa. Mesmo estando preso não deixa de escrever suas cartas que insulta aqueles que estão no poder, a próxima carta é enviada ao General Horta Barbosa, do Conselho Nacional do Petróleo: “os deliciosos e inesquecíveis dias passados na Casa de Detenção” que lhe permitiram “meditar sobre o livro de Walter Pitkin, A short introduction to the history of Human Stupidity” (apud LAJOLO, 2000, p. 70-77)

Lobato foi condenado a seis meses de prisão, a qual cumpre três meses. A tristeza o abate, dois de seus filhos vem a falecer muito jovens, o cunhado se suicida, e sua situação financeira não está em tempos bons. As traduções e a venda de algumas obras o mantém financeiramente. A ânsia da alegria o retoma quando o amigo Washington abre a Biblioteca do Congresso, ele diz “um país se faz com homens e com livros” (apud LAJOLO, 2000, p. 78), se interessa pelo espiritismo, algumas posições comunitárias e adere às ideias revolucionárias do Petróleo e futura criação da Petrobrás, nesta fase, próximo dos sessenta anos escreve Zé Brasil, sua obra mais desconhecida de todas, escrita por volta dos anos 40.

As crianças da época saúdam suas obras literárias, mas o governo logo proíbe a permanência das obras infantis nas bibliotecas. São retirados todos os exemplares das escolas públicas e queimados em colégios religiosos, o escrito sofreu tantas represálias que muda a editora que seus livros são publicados da Companhia Editora Nacional para a Editora Brasiliense.


Muda-se para a Argentina em 1946, onde suas obras infantis fazem sucesso, é recebido pelos estrangeiros com carinho e satisfação. Lá escreve o livro La nueva Argentina, permanece lá durante um ano e retorna ao Brasil em 1947, retorna com novos ideais, dos quais compreende melhor o capitalismo, se desliga da União Cultural Brasil-Estados Unidos. É convidado para se filiar ao PCB, mas recusa e envia a Prestes saudações que são lidas no comício de 1945. Após essa reformulação de opiniões Lobato escreve novamente Zé Brasil, sendo está a ultima publicação do escritor que morre em São Paulo no dia 4 de abril de 1948 aos 66 anos, com as vendas em alta sua fama retorna. Seu enterro é conduzido pela multidão de leitores, é velado na Biblioteca Municipal e enterrado no Cemitério da Consolação.

Monteiro Lobato vê a mudança dos séculos, presencia o Império e abolição da escravatura, a Proclamação da República, o surgimento do modernismo e toda a República Velha, a Revolta da vacina, o nascimento da rádio no país, revoluções de 1924 e 1930, Getúlio Vargas e o Estado Novo, Redemocratização de 1946, testemunhou a criação de quatro Constituições, viu resquícios de duas Guerras Mundiais, a Revolução Russa, em 1917 e da queda da Bolsa de Nova York, sua investida na bolsa foi mal sucedida, o que acabou com suas economias, fazendo com que se retorna para o Brasil passa por dificuldades com suas editoras, declara falência e muda de editor para escritor. Sofre tempos difíceis com a queda de suas vendas editoriais, a crise econômica chega a Lobato até em sua vida profissional. Poucas vendas de seus exemplares o obriga a fazer traduções de livros estrangeiros. Trilhou um caminho para a futura empresa petrolífera, hoje denominada de Petrobrás, e foi o autor brasileiro que mais contribuiu para o crescimento da literatura infantil no Brasil, lançou a pedagogia através da leitura, além de ensinar aos pequenos brasileirinhos as aventuras do imaginário lobatiano expandiu a criatividade das crianças, formou o intelecto dos futuros escritores.


Fonte:


SANTOS, Yndianara da Silva. Estereótipo racista na obra de Monteiro Lobato? Histórias de Tia Nastácia. Brasília, 2012.



Monteiro Lobato - O escritor de Taubaté


Grande escritor brasileiro, crítico e criativo em suas ideias abordadas na literatura infantil. Aproveitou situações da realidade para inserir em suas obras, mas com o toque para a admiração e encantamento das crianças. A imaginação de Lobato criou uma ficção para os pequenos, em seu Sítio do Picapau Amarelo habitava personagens do mundo as fábulas, lá vivia Dona Benta, dona do sítio que conhece muitas histórias cheias de aventuras e conhecimentos, tudo o que seus netos Pedrinho e Narizinho precisavam. Havia também uma cozinheira, Tia Nastácia, a dona dos bolinhos divino, foi ela que fez a boneca que logo criou vida e saiu falando pelos cotovelos, seu nome Emília. O Visconde de Sabugosa, sabugo de milho, tinha conhecimentos em fazer porções para as crianças viajarem pelo mundo e universo.


Histórias que envolvem a saga do Sítio do Picapau Amarelo abrange 22 livros, desenvolve suas e outras adaptações de Peter Pan, Hans Staden, Dom Quixote para crianças e Histórias de Tia Nastácia - folclore brasileiro. 


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

PENTEADO, José Roberto Whitaker. Os filhos de Lobato: o imaginário infantil na ideologia do adulto. 2 ed. São Paulo: Globo, 2011.

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